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Olá, meu nome é Alessandro Dantas. Sou advogado especialista em concurso público, consultor jurídico da ANDACON - Associação Nacional de Defesa e Apoio ao Concurseiro, Professor de Direito Administrativo no ES, RJ e DF e autor de obras jurídicas.

Dantas Coutinho & Sant'Ana Pedra - Escritório de Advocacia

Dantas Coutinho & Sant'Ana Pedra - Escritório de Advocacia
Advocacia especializada na área de consursos públicos: ilegalidades de psicotécnicos, exigência de prova física em provas que o agente não atua em campo, correção equivocada de provas, indenização por indenização tardia, etc..Telefax (27) 3315-1616

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

O controle jurisdicional das provas discursivas nos concursos públicos

Prezados alunos,

Estas são algumas considerações que entendo pertinentes sobre a matéria que com muita frequência venho discutindo junto ao Judiciário no exercício da advocacia.

Abraços.

Professor Alessandro Dantas

Inicialmente, tinha-se o entendimento de que era vedado ao Poder Judiciário a reavaliação da questão de prova de concurso, pois se estaria invadindo a esfera de discricionariedade típica do Poder Executivo, ofendendo assim a tripartição de poderes inserida no art. 1º da Constituição da República.

Entretanto, modernamente tem sido sedimentado o entendimento de que quando se tratar de erro na pontuação atribuída à questão, o reconhecimento desse erro, quer seja pelos conhecimentos do próprio julgador, quer seja embasado em perícia técnica, é puramente análise de legalidade, o que é perfeitamente possível de ser feita pelo órgão judicante.


Deve-se observar que a discricionariedade sobrevém tão-somente na elaboração das provas, jamais na formulação do gabarito, correção ou pontuação, onde existe vinculação. Não se pode cogitar que a discricionariedade que assiste à Administração para elaborar as provas seja ilimitada, concedendo-lhe permissão para impor gabaritos ou pontuações que não condigam com a realidade da disciplina avaliada.[1]

Mais ainda: o fato de existir discricionariedade não significa imunidade ao controle judicial. Ao judiciário só é vedado interferir no juízo de mérito do administrador, quando houver, e nos limites deste.

Como bem observado pela Desembargadora MARIA ISABEL GALLOTI RODRIGUES, do TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL da 1ª Região,

"A discricionariedade da banca, contudo, encontra limites nos princípios da legalidade e da razoabilidade, não se justificando critérios objetivamente arbitrários, e nem calendários que impossibilitem o conhecimento, pelo candidato, das razões de indeferimento de seu recurso, antes do início das provas da fase subseqüente. Indeferimento de recurso não acompanhado das razões que o motivaram equivale a não apreciação do recurso.
[...]
A Agravante fez juntar ao presente agravo cópia de sua prova de redação, para comprovar a alegação de que lhe teriam sido descontados pontos em razão de práticas consideradas corretas nos livros de gramática portuguesa adotados pela bibliografia do concurso, o que é sinal, ao menos a um primeiro exame, de verossimilhança de sua pretensão.
(TRF 1ª Região, Agr. Instr. 2005.01.00.042622-8, Decisão Monocrática, DJU 21.06.2005)

Portanto, o Poder Judiciário deverá pronunciar-se também sobre os elementos técnicos do ato administrativo, ainda que para isso, seja necessário recorrer a perícias. Sendo extremamente aviltante permitir que o poder discricionário da Comissão da Banca Examinadora se converta em manto de imunidade dos examinadores, em ordem a acobertar toda sorte de vícios de legalidade no ato da aplicação e correção das provas discursivas.

Se é certo, de um lado, que a liberdade outorgada às bancas examinadoras em sede de provas discursivas é imprescindível para resguardar a sua autonomia administrativa, também é verdade, de outra banda, que tal poder discricionário da comissão não se pode converter em manto de impunidade dos examinadores, em ordem a acobertar toda sorte de vícios de legalidade no ato de aplicação e correção das provas dissertativas, como o abuso de poder, o desvio de finalidade e outras condutas inequivocadamente lesivas à seara dos direitos subjetivos dos candidatos.
.

E arrematam MÁRCIO BARSOSA MAIA e RONALDO PINHEIRO QUEIROZ.
“...nas situações que evidenciam, de forma cristalina e irrefutável, condutas abusivas da banca examinadora no contexto da aplicação e correção das provas discursivas, é possível e imperativo o seu controle jurisdicional, no afã de salvaguardar os princípios do concurso público e o primado de sua legalidade.” (O regime jurídico do concurso público e o se controle jurisdicional. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 204.)

É dentro de tais perspectivas e mediante tais condições que deve ser acatada a tese veiculada no arresto a seguir transcrito, verbis:
ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. PROVA DISCURSIVA. ERROS NA CORREÇÃO CONSTATADOS POR PROVA PERICIAL. INTERVENÇÃO DO JUDICIÁRIO. POSSIBILIDADE. RETROAÇÃO DOS EFEITOS DE EVENTUAL APROVAÇÃO.
1. Constatada, por intermédio de prova pericial, a existência de erros na correção da prova discursiva de candidata participante de concurso para provimento de cargo público, bem assim a constatação de tratamento anti-isonômico entre os concorrentes, ainda que faltem indícios da alegada perseguição, não é dado ao juiz desconsiderar o laudo pericial, sem que haja elementos probatórios que, objetivamente, demonstrem o contrário.
2. A existência de manifestos erros na correção da prova discursiva da candidata demonstra não se cuidar, no caso, de o judiciário imiscuir-se, indevidamente, no âmbito da discricionariedade da banca examinadora, mas, sim, de proteger a esfera jurídica da candidata, uma vez que cabe ao Poder judiciário exercer o controle da legalidade dos atos administrativos, com apoio no art. 5º, XXXV, da Constituição Federal.
3. Como conseqüência do pronunciamento judicial, incumbe à comissão do concurso aferir se o somatório das demais notas alcançadas pela candidata nas provas objetiva e prática, acrescidas da nota indicada como a correta, pelo perito, na prova discursiva, é suficiente para que a candidata seja considerada aprovada classificada no certame.
4. Verificada essa aprovação, os seus efeitos retroagem, modo a assegurar à candidata todas as conseqüências patrimoniais da nomeação, como se esta tivesse ocorrido na estrita ordem classificação por ela alcançada, deduzidos, entretanto, os valores que desde então houver recebido dos cofres públicos, pelo exercício de outro cargo público.
5. Apelação parcialmente provida.
(TRF/1ª Região, AC 340.000. 1 17/DF, ReI. Fagundes de Deus, DJU, 25-1 1-2003, p. 42)

Por fim, vale a pena reproduzir as palavras do Min. NILSON NAVES, do SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, quando atuou como relator do Recurso Ordinário em Mandado de Segurança – RMS 19062:
Mas, se há erro, erro invencível, justificar-se-ia, então, a intervenção do Judiciário? Ou não se justificaria? O que a mim pessoalmente se me afigura – a não-intervenção – estranho comportamento. Quero, por isso, entender comigo mesmo que, em certas situações e determinados assuntos, é lícita a intervenção judicial (é lícito ao juiz conhecer da provocação). Aliás, o próprio Relator originário isso percebeu quando, em seu voto, referiu-se a "dissídio eloqüente" e a "causar perplexidade"; seriam e são situações aptas a provocar prejuízo, daí se justificar o mandado de segurança.
Sempre que se fizer necessária uma ressalva e esta não aparecer, de tal sorte que o candidato fique em situação de perplexidade diante do questionamento, este não pode ser considerado válido, (...) e se assim se evidencia, manifesta é a ilegalidade do questionamento e, di-lo respeitosamente, não examinar o 'mandamus', a esta ótica, é negar a jurisdição. (...) Para justificar a questão, houve necessidade de sustentá-la sobre uma noção equivocada.

Assim, conclui-se que em havendo erro na correção da questão de prova de concurso público, bem como ausência de observância às regras previstas no edital, tem-se admitido sua anulação pelo Judiciário por ofensa ao princípio da legalidade.

Desse modo, na esteira dos precedentes e da doutrina supracitados, cabe ao Poder Judiciário avaliar questão de prova de concurso quando do exame da questão impugnada pelo candidato se apresente formulação ilegal ou teratológica que de forma evidente impossibilite a análise e a conseqüente resposta do concursando.

Por mais que a Banca Examinadora possua uma autonomia para avaliar as provas, o fato é que a mesma não é absoluta, sendo limitada pelos princípios orientadores da Administração Pública já que o concurso público por si só é um procedimento administrativo que objetiva a seleção de pessoal para trabalhar em caráter permanente junto ao Poder Público.

Sendo ele realizado pela própria Administração ou por empresas terceirizadas o regime é exatamente o mesmo, da mesma forma que se passa na temática da Responsabilidade Civil do Estado, que será objetiva seja quando o dano for causado pelo Estado seja por empresas privadas prestadoras de serviços públicos.

Não há saída: a nota atribuída pela Banca Examinadora, da mesma forma que os demais atos administrativos, é precária podendo ser objeto de aferição pelo Poder Judiciário que, seja pelo vasto conhecimento deste magistrado, seja por meio de auxílio de prova pericial, há condições de verificar a real nota que o mesmo merece.
O ato administrativo possui 5 (cinco) elementos: agente, finalidade, forma, motivo e objeto. Nos atos discricionários, o exercício legítimo da discricionariedade é chamado de mérito do ato. Tendo em vista que a discricionariedade repousa apenas sobre os elementos motivo e objeto, tem-se que o mérito do ato está ligado aos mesmos.

Diferentemente dos outros elementos, o motivo e o objeto nem sempre estarão previamente estabelecidos em lei. Por vezes é dado ao agente público a autoridade/competência para determinar o motivo e o objeto do ato. Nesses casos, pautados em critérios de conveniência e oportunidade, a Administração optará pela conduta que melhor atenda ao interesse público.

Em um concurso existem atos vinculados e atos discricionários. É atividade discricionária, por exemplo: a) estabelecer os critérios de avaliação (que não podem ferir a razoabilidade, proporcionalidade), b) decidir se o prazo de validade do concurso será prorrogado; c) quando os candidatos serão convocados; c) em que setor o servidor será lotado; etc.

Já o julgamento de provas de caráter discursivo deve ser objetivo, sob pena de abertura de uma zona completamente desprotegida e imune ao controle jurisdicional, abrindo amplas possibilidades para que o administrador pratique atos ilegais, direcione o concurso para quem interessar, enfim: decida, em um processo que deveria ser seletivo, isonômico e impessoal, quem será aprovado!!!

De nada adiantaria toda a possibilidade de controle do concurso, da etapa interna, dos atos procedimentais da etapa externa, se, quando do julgamento das questões de caráter discursivo (e não subjetivo, aqui sim, se fosse, seria mérito, pois se analisaria o que era mais conveniente) o Poder Judiciário simplesmente se escusasse ao necessário amparo jurisprudencial sob a equivocada argumentação de que se trata de mérito do ato, pois, como ficará claro, não se trata.

O fato de o direito não ser uma ciência exata, como a matemática, física, estatística, não significa que a mesma seja subjetiva. Não existe ciência subjetiva!
Senão fica muito fácil aprovar e reprovar quem quiser, pois se sabe que, quando esta ilegalidade for questionada perante o Judiciário, este, sob o argumento de que não pode rever critérios de correção, julgará improcedente o pedido. Uma coisa é o Judiciário se intrometer da discussão dos critérios (antes da prova), quando estes são previamente apresentados, outra coisa é analisar a avaliação em si, quando não há critérios previamente apresentados, ou quando os mesmos não são observados
[1] Francisco Lobello de Oliveira Rocha: Regime Jurídico dos Concursos Públicos. São Paulo: Dialética, 2006. p. 142.

O exame psicotécnico nos concursos!! Jurisprudência comentada

Resumo do caso

A questão é a dispensa do candidato de ser submetido a novo exame psicotécnico em substituição ao que fora efetuado na fase inicial da disputa – este considerado nulo, em face de seu caráter sigiloso e irrecorrível. A razão dessa dispensa reside no fato de que o candidato, ao longo do curso de formação, do qual participou sub judice, foi submetido a outras avaliações psicológicas similares, daí por que não se mostra arrazoado submeter o concorrente a uma bateria de testes psicológicos em cascata apenas pro forma.

Fundamentos da decisão

Se no curso de formação, que em tese submete o candidato a avaliações mais rigorosas, porque mais diretamente voltado à atividade a ser desempenhada pelos futuros profissionais, o candidato se mostrou apto nas avaliações psicológicas, não há razão para repetir o teste psicotécnico do início do certame. Prosseguindo o julgamento, a Turma, por unanimidade, conheceu do recurso e negou-lhe provimento. REsp 332.701-PR, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, julgado em 23/10/2001.

Comentários do professor

O exame psicotécnico é aquele em que a Administração afere as condições psíquicas do candidato a provimento de cargo público. Trata-se de requisito legítimo, visto que as funções públicas devem ser exercidas por pessoas mentalmente sãs.

Segundo Luiz Pasquali, professor titular do Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília, refere-se a um conjunto de procedimentos confiáveis que permitem ao psicólogo julgar vários aspectos do indivíduo através da observação de seu comportamento em situações padronizadas e pré-definidas. Aplica-se ao estudo de casos individuais ou de grupos nas mais diversas situações. A submissão a testes psicológicos cientificamente desenvolvidos, representa uma situação padronizada típica da avaliação psicológica.

Os posicionamentos mais atualizados são no sentido de que, anulado o exame realizado ilegalmente, deve o candidato ser submetido a outro, porém, nesse caso, de forma lícita e correta. Assim, apesar de serem encontradas algumas decisões anulando o exame e eximindo o candidato de realizar outro, este posicionamento é o minoritário, sendo necessário a realização de outro. Registre-se trecho de decisão deste pretório: “O Superior Tribunal de Justiça firmou compreensão segundo a qual é exigível, em concurso público, a aprovação em exame psicotécnico quando previsto em lei, mormente para ingresso na carreira policial, em que o servidor terá porte autorizado de arma de fogo e, pela natureza das atividades, estará sujeito a situações de perigo no combate à criminalidade. Todavia, tem rejeitado sua realização de forma subjetiva e irrecorrível. 4. Recurso ordinário conhecido e provido. Acórdão recorrido reformado. Segurança concedida em parte para anular o exame psicotécnico realizado e determinar a realização de novo teste, baseado em critérios objetivos e previamente determinados, sendo o resultado, ainda, passível de recurso. (STJ - RMS 17103 - SC - 5ª T. - Rel. Min. Arnaldo Esteves de Lima - DJU 05.12.2005)